Prezad@s, compartilho aqui o texto que apresentei quando da homenagem recebida ontem, terça-feira, 06 de dezembro de 2011, pela Câmara de Vereadores de Santa Maria e pelo Conselho Municipal de Cultura de Santa Maria. Receber o Troféu Sergio de Assis Brasil fui um momento de emoção que misturou reflexão, saudade e alegria. Agradeço. Para sempre!
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Senhoras e senhores, boa noite.
Saúdo o presidente em exercício da Câmara de Vereadores de Santa Maria, o Sr. Admar Pozzobon.
Saúdo e agradeço a vereadora e amiga Helen Cabral, que apresentou o Projeto de Lei para o Troféu Sergio de Assis Brasil.
Gostaria de saudar aqui o amigo vereador Werner Rempel, com quem compartilho em muitas manhãs de sábado, entre um chimarrão e outro, um bom bate-papo sobre cinema, cineclubismo, fotografia e política na nossa CESMA, a Cooperativa dos Estudantes de Santa Maria Ltda, orgulho de todos os seus quarenta mil associados, e todos os que acreditam no cooperativismo, na cooperação como formas de fazer um dia a dia mais justo e pleno de cidadania.
Ao saudar os vereadores citados, saúdo aos demais vereadores e autoridades que aqui prestigiam este ato.
Também gostaria de saudar minha família. A Juliana Brisola, minha prima, a meu tio, Carlos Brasil Pippi Brisola e a minha mãe Terezinha Doroty Brizola Cassol.
O Troféu Sérgio de Assis Brasil já foi entregue a cineasta santa-mariense Carolina Berger, a quem saúdo com meus aplausos pelo merecido reconhecimento.
Carolina, eu e tantos outros temos algo em comum. O fato de termos sido incentivados pelo Sergio, para que nossas vidas fossem para o cinema.
Faço aqui meu reconhecimento ao querido Sergio de Assis Brasil, que, infelizmente, ao final desse mês, completará 04 anos de sua morte.
Sergio foi um guerreiro e um sonhador. Sonhou fazer cinema em Santa Maria e fez. Produziu e dirigiu curtas e médias metragens, videoclipes, séries para a televisão e comerciais e teve a coragem e a ousadia de lançar o primeiro longa-metragem santa-mariense, com equipe e elenco local. Falo do filme “Manhã Transfigurada”, baseado na obra do escritor Luiz Antônio de Assis Brasil.
Foi através daquele filme que ele formou uma geração de pessoas que passaram a trabalhar na área audiovisual.
Conheci o Sergio pessoalmente num curso pioneira de extensão sobre cinema e televisão que a UFSM ofertou em1995.
Pois após aquele curso de 1995, emblemáticamente, ano que se celebrou os 100 anos do cinema, comecei a trabalhar na área. E talvez o momento mais importante para mim, foi quando o Sergio levou latas de filmes para a sala de aula e pediu que todos cheirassem os rolos de película e daí disse: “sintam, isto é cheiro de cinema”. Pronto. Bastou. Serei eternamente grato ao Sergio por aquele momento.
Eu já era um cinéfilo de carteirinha. Mas foi o Sergio que me impulsionou para transformar e possibilidade de assistir em também fazer cinema e televisão. Foi por ter me dito: “Luiz” – era assim que o Sergio me chamava – “tens que trabalhar com cinema, com vídeo, com televisão”.
Pronto, alguns dias depois estava eu, então estudante de Administração de Empresas da UFSM, integrando a primeira equipe da TV CAMPUS. Aliás, primeira televisão de uma Universidade Pública do interior do país.
E alguns meses depois apresentava meu primeiro comentário de cinema na televisão. Comentário que gravei na então cabine de projeção do nosso saudoso Cine Glória, onde por algumas vezes assistia três filmes no mesmo dia.
Foi nesta cabina que tremendo gravei o comentário. Muito obrigado Sergio! Dizer “vamos de novo”, “tente outra vez”, foram algumas de tuas palavras de impulso que me fizeram chegar até aqui e poder hoje receber esta honraria que leva o teu nome.
Saúdo neste momento a Anamaria Assis Brasil, artista plástica e esposa do Sérgio que criou o troféu a ser recebido e, a sua filha Renata Assis Brasil, presentes neste ato.
Agora, compartilho com vocês um texto que embasou meu primeiro comentário de cinema na televisão, em 1995. Trata-se de um texto do cineasta Russo Andrei Tarkovski, retirado do livro “Esculpir o Tempo”. Uma bíblia do cinema e para o cinema.
Aliás, antes de dividir o texto, me permitam mais uma questão pessoal, este livro ganhei da Eluza Rafo, autora do conto “Cheiro de Terra”, o qual adaptei ao cinema em meu primeiro filme em 35mm, “Fome de Quê”. Eluza é a mãe de minha filha Maria Luiza e que para a nossa alegria, desde a barriga da mãe e hoje com sete anos de idade já uma cineclubista e cinéfila, indo a todas as edições do Festival Santa Maria Vídeo e Cinema, desde que nasceu. Aliás, desde a barriga da mãe.
Vamos ao texto:
“Amo muito o cinema. Eu mesmo ainda não sei muita coisa: se, por exemplo, meu trabalho corresponderá exatamente à concepção que tenho, ao sistema de hipóteses com que me defronto atualmente. Além do mais, as tentações são muitas: a tentação dos lugares-comuns, das idéias artísticas dos outros. Em geral, na verdade, é tão fácil rodar uma cena de modo requintado, de efeito, para arrancar aplausos... Mas basta voltar-se nesta direção e você está perdido. Por meio do cinema, é necessário situar os problemas mais complexos do mundo moderno ao nível dos grandes problemas que, ao longo dos séculos, foram objetos da literatura, da música e da pintura. É preciso buscar, buscar sempre de novo, o caminho, o veio ao longo do qual deve mover-se a arte do cinema.”
Como disse, este texto foi escrito por Andrei Tarkoviski, um dos mais polêmicos cineastas da história do cinema. Deixou uma obra marcada pela radicalidade estética e narrativa. Mas acima de tudo uma obra que faz pensar o cinema e suas múltiplas possibilidades.
Lá se vão 25 anos da morte deste genial cineasta russo. No entanto, seus filmes e seus textos são contemporâneos e ameaçadores a uma estética muitas vezes massificada por uma única forma de ver o cinema. Uma forma hegemônica, muitas vezes morna e sem sal.
A forma hegemônica a que me refiro são os filmes norte-americanos que invadem nossas televisões e as salas de cinema comercias, através de contratos que esfacelam a possibilidade da escolha e exibem única forma de ver e entender o audiovisual. Impondo, dizendo: assistam! Não Pensem!
Não, prezadas e prezados. Não estou aqui cravando um bandeira ante o imperialismo cinematográfico americano. Estou apenas querendo compartilhar uma reflexão. Gosto de um bom filme, de um bom debate, sou um cineclubista e um diretor que acredita que o cinema pode transformar, pode entreter, pode tudo.
Mas, quero e que as mais diferentes cinematografias cheguem até nós. Desejo que possamos ter acesso às produções audiovisuais das mais diferentes nações. É preciso ter acesso e democratizar o acesso para poder pensar o mundo além de roteiros pré-fabricados, prontos para serem empacotados ou enlatados, tal como uma música de três notas e com letra de fácil apelo.
Quero ver o cinema brasileiro em nossas telas e nas telas de outros países ao mesmo tempo que desejo ver os trabalhos de cineastas de todo o mundo.
Para piorar este situação apenas 10% da população no Brasil tem acesso aos cinemas de shopping, que além de preços abusivos no valor do ingresso, impõem esta fórmula tradicional de exibição. Então, o que fazem os outros 90%? Só não estão alijados do acesso aos filmes pois Cineclubes, Clubes de Cinema, Festivais e Salas Culturais de Cinema possibilitam isto.
Defendo veementemente a valorização dos Cineclubes no Brasil, centenas de espaços exibindo as mais diferentes cinematografias e proporcionando o debate, tudo com entrada franca. Fui forjado neste movimento e me orgulho de ser o atual presidente de nosso Conselho Nacional de Cineclubes Brasielrios – CNC. Divido esta homenagem com cineclubistas que de forma voluntária proporcionam ao público todas as manifestações audiovisuais.
Lembro que hoje esta homenagem passa por meu trabalho no Festival Santa Maria Vídeo e Cinema.
Mas esta história vem de outras pessoas e iniciativas. Destaco algumas:
O Clube de Cinema de Santa Maria organizado na metade dos anos 1950 pelo saudoso teatrólogo santa-mariense Edmundo Cardoso. O Clube de Cinema teve atividades durante 10 anos.
Também destaco o Festival Regional de Super-8 organizado em 1975 pelo amigo Luis Carlos Grassi, aqui presente, e outros realizadores de cinema Super-8, na cidade, entre eles, Sergio de Assis Brasil. Grassi é o atual presidente da Estação Cinema – Associação dos Profissionais de Cinema de Santa Maria.
Ainda lembro da professora Rhea Sylvia Gartner que organizou três edições do Festival Conesul in Vídeo no início dos anos 1990.
Ainda me reporto ao fato de em 1978, quando da criação da CESMA, também foi fundado o Cineclube Lanterninha Aurélio, que mantém suas exibições até hoje.
Finalizo lembrando dos nomes das 07 pessoas que me somei para criar a ONG Santa Maria Vídeo e Cinema, que realiza o Festival de Santa Maria.
Se recebo a homenagem hoje é graças a eles: Carlos Alberto Badke, Orlando Fonseca, Marcos Borba, Cesar Oliveira, Luciano Ribas e Christian Ludtke.
Não estando na ONG se somam a eles, a Juliane Fossatti, produtora do festival, que por seu trabalho torna possível esta edição.
Por fim destaco o Clayton Coelho, falecido prematuramente este ano e ao qual o festival presta homenagem criando o Prêmio Clayton Coelho de Direitos Humanos, causa pela qual o Clayton militava. No sábado, no encerramento do festival, o nosso amigo aqui da Câmara de Vereadores, Beto São Pedro fará a entrega do prêmio.
Agradeço aqui a presença da Dona Eloá, mãe do Clayton, que me dá a honra da presença.
Com eles agradeço a todas e todos que colaboraram na trajetória do festival e também na minha, que certamente começou em 1976, quando aos sete anos de idade, fui levado pela Terezinha Doroty Brizola Cassol, minha mãe, para assistir ao filme “Marcelino Pão e Vinho”, no Cine Independência.
Muito obrigado.
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(Mais sobre no texto da jornalista Jaiana Garcia e foto de Marcelo Cabala em www.smvc.org.br)
(Luiz Alberto Cassol / novembro de 2011.)